2015-10-31

A Cavaco quer dar posse a um governo de esquerda! (não kidding)

O chocolate branco é preto?

Então não percebo como não estão todos a ver que o Cavaco quer mesmo dar posse a um governo de esquerda? É uma gambito.

Claro que ele teria preferido dar posse a um governo com maioria parlamentar da PaF, ou um governo PaF que tivesse amarrado uns socialistas para terem a tal maioria, mas isso não é pura e simplesmente possível. A realidade é uma cadela.

Então que querem, o que querem realmente o Cavaco e a PaF? (no seguinte as expressões "PaF" e "Cavaco" são, como sempre foram, comutáveis já que isso de o presidente ser apartidário é, e sempre foi, uma treta, como não poderia deixar de ser e e pensando bem, eu até gosto que seja assim - dentro dos limites constitucionais - pelo menos assim podemos saber com o que contamos).

Se o Cavaco não pode formar um governo como pretendia, em primeira escolha, o que é que ele quer, o que é que ele realmente quer? E, perguntando o mesmo, o que é que ele não quer?

Alguns andam por aí a pensar que ele não quer dar posse a um governo à esquerda da PaF e que o discurso que fez foi papati patatá. Ora ele fez o discurso que fez - e que eu não ouvi porque a minha paciência é limitada - foi feito exactamente para poder indigitar um governo à esquerda e apesar disso poder dizer que não queria.

Dito de outra maneira quererá o Cavaco um governo PaF demissionário, sem programa nem orçamento aprovados, a governar durante 6 meses?

Outros falam de um "governo de iniciativa presidencial" sem notar que se está a falar exactamente da mesma coisa. Um governo a governar sem ter o programa nem o orçamento aprovados (e até ferido de algumas moções de censura, que na realidade não acrescentam nada de facto). Com vida limitada ao mínimo que a constituição permite, já que nem um presidente PaF poderia deixar de dissolver a assembleia nessa caso.

E isso com um parlamento hostil a aprovar dia sim dia não  qualquer coisa contra o governo, e enquanto isto a explodir algumas bombas (orçamento a entregar em Bruxelas, TAP, bancos, e mais uns tantos que eu não sei) expostas no parlamento. Alguma imprensa comprometida até poderia escamotear essas coisas, mas não será possível escamotear textos aprovados no parlamento, quer em plenário quer em comissão. E o tribunal de contas, sem saber o o que se faz sem orçamento aprovado, a por cá para fora documentos interpretativos de legalidade desconhecida mas capazes de irritar toda a gente e portanto também o governo.

Será que o Cavaco quer isso?

E enquanto corre a campanha para as presidenciais, com candidatos que se teriam irremediavelmente de pronunciar sobre a justeza e utilidade de um governo da PaF?

Penso que não quer. O que o Cavaco quer é dar posse a um governo do Costa.

Claro que tal estratégia tem os seus riscos para Cavaco. Um governo pode mesmo aprovar leis que efectivamente prejudiquem os eleitores - e os financiadores e e os políticos - da PaF.

Mas esse risco é relativamente limitado se o governo só estiver em funções somente 6 meses. É exactamente esse o ponto. O risco de um governo liderado pelo PS só é realmente um risco para a PaF se durar, digamos, pelo menos 2 anos.

Aqueles familiarizados com o xadrez sabem daquilo de que estou a falar. De um gambito. A troca de um valor presente numa estratégia para tentar recuperar um valor maior no futuro. Entregar 6 meses na tentativa de ganhar 2 (ou mesmo 4) anos.

O boys infiltrados pelo aparelho da PaF no aparelho de estado teriam em mãos uma limitação de estragos que um conhecido aparelho de estado, e poder judicial,  de grande inércia demorariam a infligir.

Aquilo com o que o Cavaco está a contar é que um governo de Costa, mesmo que com o apoio formal de todas as forças à sua esquerda - o que ainda não é certo que possa acontecer - não vai aguentar até à data em que um novo presidente possa dissolver o parlamento.

Entretanto teríamos um governo PS, sob fogo franco da sua direita e fogo mais encapotado da esquerda.

Num tal cenário o único candidato presidencial capaz de ter  um discurso coerente seria o candidato PaF, o Marcelo. O Nóvoa, teria de dar uma no cravo e outra na ferradura e a MBelém teria que apoiar o PS, o que garantiria Belém (o palácio) a Marcelo.

E entretanto o Cavaco sempre poderia dizer - e foi essa a finalidade do discurso - que não tinha querido dar posse ao PS, que não tinha querido mesmo, mas que as suas responsabilidades constitucionais e elevado sentido de estado a a tal tinham obrigado. Que até tinha tentado outras soluções, não que fosse um presidente PaF, mas que só a PaF lhe tinha dado trela. O mais difícil seria dizer isso sem se rir.

Esse é há muito o plano da PaF, claro, e claro que não podem dizer, aliás nem se atrevem a comentar entre eles, mas todos no fundo sabem aquilo que é o melhor para eles. Aliás não são os únicos a saber isso, mas tanto num caso como noutro é má estratégia revelá-lo.

O gambito pode resultar? Bem na realidade não sei que não sou bruxo. A questão é que pode resultar, e são as forças envolvidas que, pela sua actuação, podem fazer a coisa tombar para um ou para outro lado.

A ver vamos, como dizia o ceginho. Não irá haver falta de quem aponte o dedo.

(e há outras situações do xadrez, quando nenhum jogador pode fazer nenhuma jogada válida, empatando a partida independentemente das peças de cada um, ou quando as mesmas jogadas são repetidas várias vezes).

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